À frente da Rede Jesuíta de Educação desde maio de 2022, o professor Fernando Guidini concedeu uma entrevista à Revista Vieirense, do Colégio Antônio Vieira, de Salvador (BA), em que apresenta os planos da RJE, bem como os propósitos da formação oferecida às crianças e aos jovens pelas 17 unidades educativas que compõem a Rede em todo o Brasil.
Confira abaixo:
Desde que assumiu a direção da RJE, o senhor tem destacado a importância do planejamento estratégico. Considerando este cenário, quais são os planos para os próximos anos?
Nossa Rede tem sete anos e nasce praticamente com a Província dos Jesuítas do Brasil. São 17 unidades educativas, em nove estados. Temos um Projeto Educativo Comum (PEC), a partir do qual a gente estrutura as grandes dimensões da aprendizagem integral nos aspectos cognitivo, socioemocional e espiritual-religioso. Assim, a nossa Rede tem uma missão comum, uma visão, princípios, valores e também um planejamento estratégico. E este agora aponta para uma excelência ainda maior nas aprendizagens, para a qualidade da formação dos nossos educadores, para os processos de comunicação e para as estruturas de governo. A partir desses quatro grandes eixos, a RJE começa a dar novos passos de solidificação da sua presença, dentro daquilo que compreende por aprendizagem integral, atuando no contexto de Brasil e também na missão da Companhia dentro da sua grande perspectiva missionária: a ação apostólica da Província. Estamos, portanto, muito otimistas como rede em nossos planos para os próximos anos, atendendo às culturas locais, aos contextos atuais, sempre atentos ao quanto nós estamos incidindo sobre a qualidade das aprendizagens dos nossos estudantes.
Como manter essa identidade em contextos tão adversos?
A nossa identidade parte da marca apostólica e pedagógica da Companhia de Jesus. Seguimos os princípios da Pedagogia Inaciana que, por sua vez, vêm de toda a experiência espiritual de Santo Inácio de Loyola, no século XVI, e de toda a fundamentação dos documentos jesuítas ao longo dos tempos, a exemplo dos “Colégios Jesuítas: uma tradição viva no século XXI”. Então, nós bebemos dessas fontes. A partir delas, temos princípios, valores, temos toda uma raiz identitária. Aqui no Brasil, a nossa rede faz essa leitura das culturas locais e contextos globais e, a partir disso, vai definindo quais são os seus grandes horizontes, dentro da missão de promover educação de excelência, inspirada em valores cristãos e inacianos, buscando formar cidadãos conscientes, competentes, compassivos, criativos e comprometidos. É a nossa missão! Localmente, o Vieira e os demais colégios da RJE têm esta missão e, no currículo local, eles vão traduzindo o que mais atende aos estudantes, ao projeto da unidade, à realidade da cidade e, a partir disso, seguindo também a legislação nacional, vai produzindo o seu Projeto Político Pedagógico local. E, assim, nesse caminho, vai-se fortalecendo nossa identidade.
É assim também que as unidades jesuítas vão se mantendo como referência educativa na contemporaneidade?
Sim. As instituições educativas da Companhia de Jesus são instituições que foram se constituindo ao longo dos séculos, mas elas foram se formando a partir de uma leitura contextualizada das principais necessidades daquele momento histórico. Então, uma determinada unidade, um determinado colégio, no século XVI, XVII ou XVIII, respondeu ao melhor, ao mais necessário naquele momento. Os jesuítas da época iam, por exemplo, para a Universidade de Paris (e também na Itália), viam o que tinha de melhor e traziam. Hoje, nós continuamos com esse olhar atento ao movimento da cultura, da educação, às principais características de contexto, às necessárias respostas, aos índices, às métricas… A partir dessas habilidades, competências, aprendizagens mesmo, que são necessárias para o cidadão de hoje, no século XXI, nós vamos desenhando os nossos projetos. A atualização em nossa Rede é, portanto, uma resposta às necessidades, mas também um olhar sempre à frente do que pode e deve ser trazido no currículo para que responda melhor a esse estudante que hoje está conosco, mas que daqui a alguns anos estará na vida adulta. Por isso, a importância desse passo sempre à frente das nossas instituições.
Como estar à frente em meio a esses tempos de alta tecnologia e velocidade da informação, já tão dominados pelas crianças e jovens nativos digitais?
O Vieira e as demais unidades da Rede no Brasil buscam estar atentas e constantemente desenvolver estudos sobre o contexto e os sujeitos com os quais a gente trabalha. Assim, a perspectiva da aprendizagem integral se dá sobre o viés do estudante: quem é essa criança, quem é esse adolescente, quem é esse jovem? Como ele aprende, quais são os seus tempos e espaços? Quais as melhores mediações? O que inovar, o que atualizar, o que trazer de tecnologia? Desta forma, vai se organizando toda a perspectiva curricular dos colégios, sempre atenta à nossa matriz identitária e ao que a legislação nacional ou local nos pede, a exemplo da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), entre outros referenciais curriculares. A finalidade é a tecnologia? Não. A finalidade do nosso projeto é a formação integral do estudante. Os meios tecnológicos são um dos recursos para isso, mas sempre pensados, a partir dos propósitos da didática, com o coletivo dos professores discutindo sempre, avaliando, se informando, estudando e, aí, tendo o discernimento tão próprio da nossa Pedagogia, a gente vai avançando, dentro da reflexão constante sobre o que é melhor para os nossos estudantes.
O senhor destaca a importância dessa formação da equipe pedagógica, do discernimento… Como isso se dá na prática?
A educação é feita por pessoas. E são os educadores que estão à frente, são a referência. Então, a gente tem um compromisso muito grande, como Educação da Companhia de Jesus, ao pensar nesses tempos e espaços, conteúdos e principais aprendizagens que são pertinentes para os professores e demais educadores dos diferentes setores dentro da instituição. Esse é um ponto. O outro é o braço da identidade, da espiritualidade, das experiências, permitindo que nossos educadores bebam das nossas fontes e aí, a partir disso, transmitam esse ser competente, consciente, compassivo, criativo e também comprometido. E o terceiro aspecto da formação envolve também esse olhar sobre o contexto, sobre a cultura, sobre as tecnologias, sobre o movimento dahumanidade, esse olhar crítico e sensível sobre as situações. A partir disso, a gente vai estabelecendo norteadores que retroalimentem todo o projeto da
instituição, mas, sem dúvida, um ponto muito sensível é esse: a atenção às pessoas, porque são elas, são esses educadores, que fazem com que a nossa proposta se materialize no dia a dia.
Qual a mensagem final para as famílias e seus filhos e filhas que integram a nossa comunidade educativa?
Primeiro, um agradecimento por confiarem na educação da Companhia de Jesus. A razão de ser do Vieira, da nossa Rede, são vocês. São, então, famílias, milhares ao longo do nosso país, milhares aqui do Vieira, que confiam na nossa proposta pedagógica, que entendem nossos princípios, valores e, conosco, tornam-se mais um desses sujeitos a educar os seus filhos, os nossos estudantes. E aos nossos alunos, desde os pequenininhos até os maiores, quero dizer que vocês são a nossa alegria, nossa força, ânimo e garra. Por vocês, a gente levanta todos os dias para cumprir essa bela missão educativa. Que vocês aproveitem esse tempo, os espaços do colégio e aprendam bastante. Temos um elemento que nos é muito caro na nossa pedagogia: o sucesso de todo o nosso trabalho pedagógico deve ser medido sob a forma como os nossos estudantes comprometem as suas vidas depois que saem do Vieira. E o Vieira tem essa história: a gente vê quantas gerações que já passaram por aqui e o quanto bem elas fazem, a partir de uma educação voltada para e com os demais. Por isso, nosso muito obrigado.