Lazer em família e memórias inesquecíveis

Texto publicado originalmente na Revista Conviva n.º 80 | setembro de 2022, por Jaqueline Ribeiro e Janete Becker


Você já parou para pensar na importância da qualidade do tempo dedicado a você e aos seus familiares? Estamos vivendo novos tempos. Nesta nova realidade, as pessoas precisam vender o seu tempo para viver, afinal, trabalhar nada mais é do que vender o próprio tempo em favor de um serviço, de uma obra, de um objetivo ou de uma missão. Se, por acaso, sobrar-nos algum tempo, fazemos horas extras; mas nunca temos tempo para descansar – nem para confraternizar. Aliás, até para fazer caridade precisamos de tempo. E como ninguém tem tempo a perder…

O tempo é uma invenção humana, necessária a tudo ou quase tudo. Convenções determinaram o horário comercial, a hora da aula, a idade para o alistamento militar, para fazer o título de eleitor e a carteira de habilitação. Contamos os dias que faltam para aquele encontro, para o jogo do nosso time, para o show do artista, para começar o verão. Não podemos nos atrasar para a consulta médica, para o embarque da viagem, para a inscrição do ENEM.  Marcamos o dia do casamento, a data para começar a dieta e a hora da academia. Inventamos o “TBT”, o casual day, o happy hour, a hora do “esquenta”, da balada e até do after. Mas e a hora de sermos nós mesmos? Quando teremos tempo para viver, sem preocupações, o tempo que falta para acabar o pouco tempo que nos resta?

Teremos que nos aposentar antes para só depois retomarmos o convívio daqueles que amamos, os passeios com o filho, as férias com a família, as conversas de fim de tarde nas varandas? Teremos tempo para isso? Será que ainda haverá tempo para conversar, abraçar, olhar, dividir?  Ainda haverá tempo para planejar? Afinal, que tempos são estes?

A importância de disponibilizar um tempo com mais qualidade ao lazer em família também é reafirmada pelo Papa Francisco, que nos brinda com o precioso ensinamento: “O amor precisa de tempo disponível e gratuito, colocando outras coisas em segundo lugar. Faz falta tempo para dialogar, abraçar-se sem pressa, partilhar projetos, escutar-se, olhar-se nos olhos, apreciar-se, fortalecer a relação”. (Amoris Laetitia, 224)

Embora, muitas vezes, seja difícil, precisamos transformar o lazer em família em um hábito. Mas como começar?  Além de ser uma boa dica, otimizar um planejamento em conjunto constitui-se em um grande aprendizado. Um diálogo em que se priorize a opinião de todos os integrantes do núcleo será sempre o melhor caminho ao consenso e ainda revelará o quanto podemos aprender com nossos filhos, a todo instante. Na medida em que crescemos, abandonamos a leveza de viver e nos deixamos engessar por padrões culturais. Precisamos reaprender a  escorregar, cair, chorar, levantar e voltar rapidamente, a reagir e a sorrir como as crianças. Elas estão sempre dispostas ao recomeço, ao movimento de aprender e reaprender. E o mais inexplicável: sempre encontram tempo para tudo!

No universo infantil, não há tempo a perder com ressentimentos. As crianças nos ensinam a não ter mágoa e a perdoar facilmente. Elas brigam e daqui a pouco já se tornam melhores amigas. O tempo que perdemos com o revide a ofensas é por elas aproveitado com novas brincadeiras e muitas gargalhadas. Não precisamos matar a criança que ainda existe em nós para sermos um adulto responsável! Urge, também, redescobrirmos a persistência do adolescente. Curioso, está sempre buscando novidades e sabe explorar tudo ao seu redor como um eterno desbravador. É insaciável na vontade de se divertir.

Reclamamos, muitas vezes, que nossos filhos vivem isolados nas redes sociais, mas em contrapartida, o que proporcionamos a eles, além de dizermos que seus hábitos precisam ser mudados? Você sabia que o lazer em família é uma boa sugestão? Mesmo que haja resistência ao primeiro convite, não devemos desistir de investir nessa busca por encontrarmos tempo e prazer em estarmos juntos, mesmo que apenas em um grande abraço coletivo, no qual só escutaremos os corações batendo pela alegria do momento partilhado.

Poderá haver maior legado para seus filhos do que fazer parte das suas memórias como alguém que os orientou, acolheu em suas fragilidades, enalteceu suas vitórias, brincou muito, praticou o mesmo esporte, aprendeu e reaprendeu a se constituir como “homens e mulheres para os outros e com os outros”, como ensinou Santo Inácio?

Esperamos que, ao final desta leitura, você se sinta convidado a repensar a sua agenda e motivado a reavaliar a qualidade das interações em seu núcleo familiar. Sem a pretensão de que você abandone seus projetos e sonhos profissionais, lembramos que as memórias do futuro serão construídas ao longo dos próximos anos, de acordo com as trajetórias vivenciadas diariamente. Por isso, compartilhamos com você os depoimentos de cinco famílias que trabalham para dedicar mais tempo às pessoas.

Família Rodrigues Agostinho

Sérgio Murilo Agostinho (pai), Ludmar Lana Rodrigues Agostinho (mãe), João Vitor Rodrigues Agostinho (ex-aluno – atualmente estudante de Odontologia na UFSC), Isabela Hilda Rodrigues Agostinho (9º ano).

“O desejo e a necessidade de conquista pessoal têm refletido fortemente na relação familiar. Essas ‘prioridades’ têm transformado os lares, apartando os membros das famílias, convertendo-os em verdadeiras ‘ilhas pessoais’. Além do apelo midiático, há teorias que, massivamente, fundamentam e incentivam essa opção. A par dessa realidade, na nossa família, procuramos adotar práticas e costumes que incentivem e valorizem o convívio coletivo, sem deixar de reconhecer os anseios pessoais de cada um. Nada de novo: sentar juntos à mesa no café da manhã, almoço e jantar; manter a prática de comemorar coletivamente aniversários e datas importantes; realizar viagens e ir ao cinema em conjunto; andar de bicicleta e jogar futebol; promover discussões juntos para a resolução de problemas coletivos e individuais – todas essas são algumas das práticas adotadas para manter firme o vínculo familiar. Não é fácil resistir ao irresistível; as forças contrárias são permanentes. Mas continuamos firmes no propósito de mantermos estreitos os nossos laços familiares”. 

Família Previtali

Antonio Previtali Júnior (pai), Nuno Matias Previtali (1ª série), Pietro Matias Previtali (7º ano), Joaquim Matias Previtali (5º ano).

“Sem drama nem exagero, costumo dizer que vivo para encaminhar os três adolescentes que crio, embora, neste momento, eu me encontre em processo de ‘recasamento’. Tarefa fácil não é, mas sinto prazer em encaminhar e vencer os desafios do cotidiano. Acompanhar o desenvolvimento escolar, levar às consultas médicas e aos exames, transportar ou cuidar da logística das diferentes atividades extracurriculares, tais como inglês, futsal, psicóloga e psicopedagoga – tudo isso multiplicado por três e em horários muitas vezes conflitantes entre si e com a minha agenda profissional – exige um mínimo de planejamento, supervisão e, claro, flexibilidade no trabalho. O curioso é que as pessoas me veem como um superpai, justamente alguém de quem se deveria esperar a responsabilidade pela educação dos filhos, o que, muitas vezes, é associado a uma obrigação desprazerosa. E o que ocorre é justamente o contrário, pois eu me sinto um felizardo, um iluminado pela oportunidade de crescer e aprender com eles. Sim, o prato do que recebo de aprendizado é muitíssimo mais pesado do que o do conhecimento que transmito. Tenho, também, consciência da necessidade de incluir momentos de lazer dentro dessa jornada, marcada em boa parte pela cobrança. Brincadeiras descompromissadas divertem, contatos físicos unem, risadas espontâneas relaxam. Jogamos juntos, velejamos juntos, cavalgamos juntos, comemos sushi juntos… E assim, o intenso e o leve coexistem”. 

Família Moraes

Cristian Marques da Costa Moraes Rosa (mãe), João Batista Rosa (pai), Beatriz Moraes Rosa (ex-aluna – atualmente estudante de Odontologia na UFSC), Júlia Moraes Rosa (4º ano).

“Eu e meu marido somos casados há 25 anos e temos duas filhas, uma com 20 anos, universitária, e a outra com 9 anos, que está no 4º ano do Ensino Fundamental. Nossa família sempre procura criar momentos em que todos nós possamos estar os quatro juntos, seja em uma caminhada nos finais de semana, uma ida ao shopping ou até mesmo assistir a um simples filme na Netflix. O importante é termos esses momentos só nossos! Se, durante o planejamento das atividades de lazer em família, surgirem propostas muito diferentes, apresentamos, como adultos, a sugestão de um rodízio. E por isso, nunca tivemos dificuldades por nossas filhas terem uma diferença significativa de idades. Gosto sempre de relembrar a todos que esses momentos juntos foram construídos por nós e fazem muita diferença na vida das nossas filhas, aproximando-as ainda mais, além de criar alicerces que reafirmem que seus pais estarão sempre ao lado delas para orientá-las, incentivá-las e amá-las eternamente! Uma coisa simples que fazemos e é muito prazerosa é soltar pipa na praia, na época de inverno. Parece bobo, mas agrada a todos. Além da diversão, o contato com a natureza reativa nosso bem-estar físico e espiritual. Amamos estar juntos”.

Família Tolotti e Mello

Isabela Nunes Tolotti (mãe), Flavio Caldas Pereira de Mello (pai), Eric Tolotti Pereira de Mello (8º ano).

“O tempo com os filhos é essencial para o desenvolvimento e estreitamento dos laços da família. A qualidade do tempo que se tem junto é infinitamente mais importante do que a quantidade de tempo. Fazer atividades juntos promove, para ambos, a experiência do aprendizado.Podemos ensinar e aprender com nossos pequenos. Nossa família faz muitas atividades. O esporte preferido do pai e do filho é o surfe. Andamos de bicicleta juntos, praticamos jiu-jítsu e adoramos ver um filme, os três, na cama! São esses momentos de felicidade e partilha que nos fazem ter certeza de que a vida vale a pena”.

Família Freund

Ana Paula Ferreira Freund Winneschhofer (mãe), Leonardo Freund Winneschhofer (7º ano), Pedro Freund Winneschhofer (ex-aluno – atualmente estudante de Administração na ESAG – UDESC).

“Viver em família não somente envolve educar filhos para a vida, mas envolve, também, a criação de experiências e emoções para o coração, para a alma e para a vida… Nada melhor do que brincar com meus filhos… Brincávamos quando eles eram pequeninos, de esconde-esconde, por exemplo… Brincávamos de super-heróis, Pedro e Leo iam fantasiados até para o supermercado (e, naqueles momentos, só atendiam por “Batman” ou “Homem-Aranha”). A imaginação deles nos deixava cada dia mais jovens. Eles foram crescendo, e as brincadeiras foram mudando… Passamos de pique-esconde para montanhas-russas e jogos de aventura… Confesso que tive medo, mas nada supera a emoção de brincar junto aos meus filhos, porque a cada brincadeira, não somente a memória se faz, mas os laços de amor e amizade entre pais e filhos se solidificam. Se eu tenho um conselho? Brinquem com seus filhos. A vida é um sopro, mas as memórias são eternas”. 

Fonte: Colégio Catarinense

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