Por Alexander Pereira, professor de música da Educação Infantil e do Ensino Fundamental I do Colégio São Francisco Xavier, em São Paulo (SP), bacharel em Música pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) – composição e regência – e mestre em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.
Atualmente, é possível afirmar que o estudo da música pode contribuir no desenvolvimento intelectual, social e cognitivo das crianças. O estudo da música pode contribuir para o desenvolvimento da criatividade. Compor ou improvisar estimula que o córtex cerebral mude de formato. Os ganhos obtidos com o estudo da música podem ser aproveitados em outras áreas do viver. “Por exemplo, crianças que aprendem instrumentos rítmicos obtêm melhor pontuação em problemas de matemática do tipo parte-todo do que aquelas que aprenderam piano ou canto” (HALLAM, 2012, p. 30).
As várias possibilidades de estudo da música estabelecem conexões distintas em nosso cérebro. Tocar um instrumento pode levar a criança a um bem-estar muito grande, a um aumento de autoestima pode levar a criança a enfrentar com mais coragem os desafios que se apresentarão ao longo da vida. Outro ganho é o aumento da disciplina e determinação exigidos para quem quer tocar bem.
O processo de construção de uma mostra musical é lento e as várias alegrias que acompanham esse processo são motivadoras, nos encorajam a dar mais um passo rumo ao resultado; por exemplo, uma apresentação, um vídeo publicado em uma mídia social, uma mostra. “A experiência autotélica, ou flow, eleva o curso da vida a outro nível. O alheamento dá lugar ao envolvimento, o desfrute substitui o aborrecimento” nos mostra Csikszentmihalyi (2002, p.103).
A alegria do agora nos leva à alegria futura, nos mostra Csikszentmihalyi (2002, p.103) “Quando a experiência é intrinsecamente gratificante, a vida justifica-se no presente”. Fazer música é um ato que possui motivação intrínseca e, a esse respeito, Gardner mostra o pensamento de Csikszentmihalyi.
Csikszentmihalyi descreveu um estado de fluxo ou experiências de fluxo. Nessas experiências intrinsecamente motivadoras, que podem concorrer em qualquer domínio de atividade, as pessoas se descrevem como profundamente envolvidas e absorvidas pelo objetivo de sua atenção. (GARDNER, 1996, p.23).
Em muitos momentos, em sala de aula, fui surpreendido com alunos que vinham até mim, não na primeira aula; na segunda aula de um novo projeto, eles me mostravam com entusiasmo o quanto haviam evoluído de uma semana para a outra. Quanto tempo investido, quanto estudo, quanta alegria, alegria do fazer. Algumas vezes, os próprios pais me procuravam para dizer que nunca haviam visto seus filhos tão motivados, tão envolvidos em alguma atividade.
“Cantar num coro e tocar num conjunto de cordas amador são duas das formas mais excitantes de experimentar a combinação das nossas faculdades com as dos outros”. (CSIKSZENTMIHALYI, 2002, p. 158). A escola pode fomentar isso sem muita dificuldade.
A pianista e terapeuta musical argentina, Violeta Hemsy de Gainza nos assegura que:
O espírito pedagógico é curioso e criativo, inquieto. É uma linha que avança vibrante, mas que se move e ondula porque aspira a explorar até o último resquício do homem e da música. Não repete simplesmente o que diz o livro, mas o recria a cada momento. (GAINZA, 1988, p.96).
É importante que os professores sejam curiosos e criativos, que o incômodo criativo continue a levá-los a novas descobertas. Para isso, é necessário muito trabalho e conhecimento para que não se acomode.
“As pessoas criativas não estão presas a um momento congelado no tempo. Elas usam o melhor conhecimento do passado e do presente para descobrir uma maneira melhor de viver o futuro”. (Csikszentmihalyi, 1999, p. 152).
O futuro depende de decisões tomadas no presente. Consulta-se o passado para decidir o agora. A criatividade é estimulada pela alegria motivadora e deve ser incentivada na escola por todos que estão envolvidos.
“E, no entanto, é preciso cantar, mais que nunca, é preciso cantar; é preciso cantar e alegrar a cidade”. (Carlos Lyra e Vinícius de Moraes, Marcha de Quarta-Feira de Cinzas, álbum de Carlos Lyra e Tamba Trio, 1962).
BIBLIOGRAFIA
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